Em 2008, durante a campanha
eleitoral, fui acusado pelo então vice-prefeito e candidato a prefeito pelo PP
de que, quando no exercício da administração municipal, eu teria ordenado que a
fiscalização municipal autuasse os produtores rurais familiares, confiscando-lhes
os produtos que transportavam para autoconsumo e comércio na cidade. Na campanha eleitoral de 2012, o assunto retornou de forma dissimulada, menos invasiva, é verdade, porque o alvo
preferencial do conservadorismo não era eu, mas o Diniz Cogo.
Esta semana, quando houve a
entrevista do proprietário do Frigorífico RM Sagrilo, sabidamente vinculado ao
PP, numa emissora local, afirmando que cerca de 80 por cento da carne consumida
em Santiago é proveniente do abate clandestino, portanto, sem controle sanitário
e sem recolhimento de impostos, julguei que esta seria a oportunidade de reabrir o debate sobre o tema – fiscalização tributária e vigilância
sanitária municipal.
Preliminarmente, é preciso lembrar
que o quadro de servidores da fiscalização é regido por legislação específica e
seus membros têm poder de polícia, independência funcional e não recebem ordens
diretas do prefeito e do secretário para autuar este ou aquele munícipe, sem que haja a devida fundamentação legal. Sua atuação deve ser
pautada nos preceitos legais e nos princípios da administração pública. É claro,
não podem imitar os fiscais da prefeitura de São Paulo, que transformaram a
fiscalização de empreendimentos privados num balcão de negócios.
O gestor que ordena ao fiscal que
autue ou não um contribuinte, ao arrepio da lei, comete o crime de prevaricação e
assédio moral, passível de penalização criminal. Da mesma forma, o fiscal que
cumpre ordens dessa natureza, sem respaldo na legislação, incorre no mesmo
crime e se comporta não como servidor público, mas como vassalo.
Rebati as acusações, na época, de que
tal afirmativa carecia de fundamento e que críticas dessa natureza feitas por um
gestor público poderiam ensejar uma representação judicial por crime de calúnia e difamação, já que fui acusado de prevaricação
pelo candidato a prefeito.
Não encaminhei a demanda porque, até certo ponto, subestimei a extensão dos efeitos das assacadilhas perpetradas pelo candidato e
pela sua equipe de apoiadores governistas. Também porque, durante o meu governo,
ao reorganizar, por lei, o serviço municipal de fiscalização, ampliando o
quadro de fiscais por concurso público, instituindo plano de cargos e salários
e estabelecendo atribuições típicas de estado para os fiscais, fui movido pelo dever
inalienável de que era impostergável o controle da qualidade dos alimentos
consumidos pela população, evitar a evasão de receitas e colaborar com outras
esferas de governo para combater o abigeato que grassava na região.
À medida que passavam os anos, fui
percebendo que a leviana acusação havia se cristalizado na mente de pessoas inocentes,
que passaram a acreditar que isso era verdadeiro. Não compreenderam que essa
era uma das estratégias de ação política continuísta, para desconstrução da
minha imagem de administrador junto ao público mais diretamente ligado ao meio
rural.
Uma mentira repetida muitas vezes, e
por muitos, acaba sendo considerada verdade, se não houver a pronta reação, na
mesma medida. Neste aspecto, reconheço que não consegui desmistificar a ardilosa
patranha montada pelo candidato do PP e seus companheiros, durante a campanha
eleitoral.
A primeira conclusão a que poderíamos
chegar, após ouvir a declaração do Empresário da Indústria de Carnes, é de que
o órgão municipal de controle do comércio e circulação de produtos de origem
animal é incapaz de coibir o abate clandestino, não sei se por negligência e omissão ou
por conivência com os infratores.
Hoje, sei que os serviços de
fiscalização durante o meu governo desagradaram alguns munícipes de alto
coturno que, certamente, não procediam em conformidade com legislação brasileira. E, ao que
parece, foi muito fácil encontrar guarida no seio largo do PP, e obterem o compromisso
de aliviar, desmontar ou neutralizar a ação fiscalizatória no Município de
Santiago, caso houvesse a alternância de governo. Conseguiram!
E o que temos hoje? Cerca de oitenta (80)
por cento da carne consumida pela população sem garantia de que não esteja contaminada de patógenos causadores de enfermidades, além de considerável avanço
do roubo de gado na região! E o que faz o serviço municipal de fiscalização?
Sei, apenas, que dois antigos fiscais se licenciaram de suas funções e/ou entraram em
gozo de férias para trabalhar no comitê de reeleição do atual prefeito, em
2012. Estranho? Normal? Talvez!
Impõe-se, ainda, que se dê um desconto a esse percentual em consequência do autoconsumo das famílias que são proprietárias de
estabelecimentos rurais e moradoras na cidade. Estas costumam abastecer-se em suas granjas, sítios e fazendas com as carnes de bovinos, ovinos, suínos e aves, etc., que
são abatidos no próprio estabelecimento. Nestes casos, o papel da fiscalização municipal
deve ser de atuar apenas no sentido de que os produtos sejam transportados acondicionados
adequadamente e acompanhados da respectiva Nota Fiscal de Produtor, para assegurar-se de que sua origem é absolutamente regular. Esta medida, repelida
por alguns, por desinformação ou má-fé, é imprescindível para que se faça a
efetiva diferenciação quanto ao uso e destinação da produção familiar.
A finalidade precípua da fiscalização
municipal é garantir produtos sadios e de boa qualidade para consumo humano,
coibindo a comercialização de produtos originários do abate clandestino de
animais com procedência duvidosa, quanto à sanidade e a forma de obtenção. Outra
atribuição importante é de natureza fiscal, a exigência da apresentação da Nota
Fiscal de Produtor para comprovação da origem dos bens, como
medida indispensável para assegurar o recolhimento dos tributos que são devidos
ao Município, além de proteger os verdadeiros produtores da concorrência
desleal e predatória de quem não respeita o ordenamento legal.
Se eu agisse com a mesma lógica
irresponsável dos governistas nas eleições de 2008, diria que o atual
administrador municipal ordenou aos seus fiscais que cerrassem os olhos para o
transporte das carnes oriundas do meio rural, como se todas elas fossem destinadas para autoconsumo familiar. Não creio que o atual gestor, a
despeito do deslize cometido como vice-prefeito, na campanha eleitoral de 2008,
seja conivente com o comércio de produtos de origem animal sem a devida inspeção
sanitária, aceite abrir mão de receitas públicas importantes decorrentes da
sonegação fiscal ou que tenha ordenado o arrefecimento das ações de fiscalização
no Município.
Penso que a Câmara de Vereadores de
Santiago, tão ciosa de seus deveres com a coletividade, saberá avaliar a
atuação e o desempenho do setor de fiscalização e se toda a carne consumida em Santiago
tem os padrões de qualidade estabelecidos na legislação vigente.